Quem nunca entrou em um banheiro público masculino e percebeu olhares e movimentos que iam muito além do ato mecânico de usar o mictório e lavar as mãos?
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Este universo é o foco de Amigos de Banheirão, espetáculo que estreia nesta quinta-feira 14 em São Paulo.
A história reúne cinco homens que vivem em situação inusitada neste espaço em um dia muito importante e recente para a política nacional.
A ideia, conta o autor e produtor Ale Cruz, surgiu há dois anos quando ele estudava dramaturgia na SP Escola de Teatro e lhe foi pedido para escrever uma carta endereçada a um desconhecido.
"A partir dessa proposição e das minhas observações pessoais das práticas e dinâmicas das interações durante a pegação nos banheiros públicos das estações de trem da CPTM, e em outros banheiros públicos pela cidade, além de pesquisa feita no Twitter e da leitura da tese de mestrado de Tedson da SIlva Souza (UFBA), comecei a escrever um argumento que tentasse elucidar o porquê de tanta homofobia, exclusão, alienação e subjulgação nesses espaços e nessas práticas", explicou Cruz, ao Guia Gay São Paulo.
"Não demorou muito para que eu entendesse a dinâmica do silêncio, a comunicação feita de olhares e os códigos trocados entre os frequentadores, bem como suas possíveis identidade ali dentro e fora daquele espaço", continua. "Contudo, mais do que isso, me chamou a atenção a passividade com que os frequentadores mais velhos ou fora dos pradrões convencionalmente desejados aceitavam a função de 'guarda' da porta ou de voyeur. Os mais novos e não afeminados sempre eram os prediletos e os mais procurados."
Cruz, que também atua na peça e a codirige junto a Cris Neützling, destaca que tão importante para a pesquisa também foi registrar a homofobia nestes espaços.
"Essa homofobia aparecia expressa na forma como os funcionários das estações tratavam os amantes quando pegos em flagrante de 'atentado ao pudor', geralmente, com violência, intimidação ou até extorsão. E, obviamente, a contradição, imanente a todo ser humano, também se revelou quando esse mesmo funcionário homofóbico, após o expediente, encontrava-se e divertia-se com aqueles que outrora oprimia."
E qual a percepção que ele teve dos frequentadores? 'Após longa observação, comecei a entender que aqueles que estavam 'viciados' em 'banheirão' muitas vezes eram homens tristes, depressivos, sem perspectivas reais de outras vivências que os possibilitassem viver plenamente a sua sexualidade. Os casados que querem 'dar uma descarregada' na primeira hora da manhã ou no final do dia se enganam porque na verdade o que gostariam de fazer fora do banheiro jamais lhe seria permitido."
"Os gays que frequentam esses espaços, muitas vezes, com baixa autoestima e propensos a comportamentos sexuais de risco, se prestam a servir de cobaias para experiências aleatórias de homens que nunca assumirão sentir prazer com esse tipo de prática. Existe nesta prática um pacto mútuo e voluntário em nome de um prazer proibido."
"Contudo, os gays são os únicos a perderem quando estão fora do terreno 'sagrado'. Os homens que se permitem sentir esse prazer naquele espaço, mas que repudiam e oprimem a ideia de serem chamados de gays na rua, na verdade, também votam e atentam contra a vida daqueles homens 'descartáveis' que os chuparam nos banheiros. E os gays que, ou por carência, ou por vivências outras, muitas vezes enraizadas em práticas antigas de pegação clandestina, se submetem a correrem riscos e ou a serem expostos ao rídiculo e a extorsão, quando não ao assassinato, em busca de uma materialização imagética heteronormativa do 'homem de verdade'.
Amigos de Banheirão faz temporada de quinta a sábado no AP32 até 7 de dezembro. Mais informações você tem em nossa Agenda clicando aqui.
